Câmara Municipal de São Paulo

Decreto Nº 59.246, DE 28 DE fevereiro DE 2020




Dispõe sobre os procedimentos e o tratamento à população em situação de rua durante a realização de ações de zeladoria urbana.

BRUNO COVAS, Prefeito do Município de São Paulo, no uso das atribuições que lhe são conferidas por lei, e à vista do disposto na Lei nº 17.252, de 26 de dezembro de 2019,

D E C R E T A:

Art. 1º Este decreto dispõe sobre os procedimentos e o tratamento à população em situação de rua durante a realização de ações de zeladoria urbana em logradouros, praças e vias em geral.

DOS CONCEITOS

Art. 2º Para fins deste decreto, considera-se:

I - população em situação de rua: grupo populacional heterogêneo que possui em comum a pobreza extrema, os vínculos familiares interrompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia convencional regular e que utiliza os logradouros públicos e as áreas degradadas como espaço de moradia e de sustento, de forma temporária ou permanente, bem como as unidades de acolhimento para pernoite temporário ou como moradia provisória, nos termos do parágrafo único do artigo 1º do Decreto Federal nº 7.053, de 23 de dezembro de 2009, e do parágrafo único do artigo 1º da Lei nº 17.252, de 26 de dezembro de 2019;

II - zeladoria urbana: conjunto de atividades e serviços executados pelo Poder Público Municipal e por empresas por ele contratadas visando promover a limpeza, manutenção ou recuperação de áreas públicas, tais como varrição, limpeza de bueiros e calçadas, lavagem e varrição de calçadas e ruas, cata-bagulho, reformas, reparos e outras atividades de mesma natureza.

DOS PRINCÍPIOS

Art. 3º As ações ou operações de zeladoria urbana deverão observar os seguintes princípios:

I - a preservação de direitos e bens de todas as pessoas, incluindo aquelas que se encontram em situação de rua, garantindo-lhes o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade;

II - a legalidade e o devido processo legal;

III - o tratamento não discriminatório e o respeito às especificidades de gênero, raça, etnia, orientação sexual, idade, religião e eventuais deficiências;

IV - o diálogo como forma de solução de conflitos;

V - a transparência e a publicidade das ações públicas.

Parágrafo único. Nas ações de zeladoria urbana, não será empregado o uso da violência e não serão adotadas medidas que desrespeitem a integridade física e moral das pessoas em situação de rua.

DAS COMPETÊNCIAS

Art. 4º As atividades de zeladoria urbana serão coordenadas pela Secretaria Municipal das Subprefeituras e por cada Subprefeitura, podendo contar com o apoio de funcionários terceirizados.

Parágrafo único. A Guarda Civil Metropolitana poderá ser instada a acompanhar as ações de zeladoria urbana para colaborar na mediação de conflitos e assegurar a proteção cidadã de todos os envolvidos nas ações, funcionários, população em geral e pessoas em situação de rua.

DOS PROCEDIMENTOS

Art. 5º A Secretaria Municipal das Subprefeituras e as Subprefeituras deverão informar, mensalmente, os locais de realização das ações de zeladoria urbana com concentração de pessoas em situação de rua às equipes da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social dos respectivos territórios.

Art. 6º As ações de zeladoria urbana poderão ocorrer em qualquer horário e dia da semana.

Art. 7º Quando a ação de zeladoria urbana for realizada em locais onde haja pessoas em situação de rua, as equipes deverão informá-las sobre:

I - a ação que está sendo realizada no local, descrevendo os procedimentos que serão adotados;

II - os bens que podem ou não ser recolhidos;

III - o procedimento de restituição de eventuais bens apreendidos administrativamente, nos termos dos artigos 10 e 11 deste decreto.

Art. 8º Na realização das ações de zeladoria urbana, é expressamente vedado aos servidores e funcionários terceirizados:

I - tratar qualquer cidadão de forma desrespeitosa, ofendendo sua dignidade física e moral;

II - recolher bens e pertences em desacordo com o previsto nos artigos 10 e 11 deste decreto;

III - remover compulsoriamente, fora das hipóteses legais, as pessoas do local que estejam ocupando ou adotar medidas que forcem seu deslocamento permanente;

IV - impedir o retorno das pessoas em situação de rua após o término da ação de zeladoria urbana.

§ 1º Havendo apreensão de bens duráveis durante a ação de zeladoria urbana, a Prefeitura passará a deter a sua guarda na qualidade de fiel depositária, cabendo à respectiva Subprefeitura inventariá-los e encaminhá-los a depósitos adequados à sua preservação.

§ 2º Na hipótese do § 1º deste artigo, os possuidores serão notificados, no local e momento da apreensão, a respeito da destinação dos bens, recebendo o contralacre com a informação de que poderão retirá-los no prazo de 30 (trinta) dias corridos, contados da apreensão, no local indicado.

§ 3º Decorrido o prazo fixado no § 2º deste artigo sem que ocorra a retirada dos bens, estes serão descartados, cessando a responsabilidade da Prefeitura pela sua custódia.

§ 4º Os bens inservíveis, perecíveis, excessivamente deteriorados ou que não revelem valor econômico ou utilitário sob qualquer perspectiva poderão ser descartados de imediato.

Art. 9º As equipes de zeladoria deverão incentivar e orientar as pessoas em situação de rua a procurarem os serviços socioassistenciais oferecidos pela Prefeitura.

Parágrafo único. No caso de identificação de problemas de saúde ou de necessidade de atendimento às pessoas em situação de rua durante a realização das ações de zeladoria urbana, o servidor responsável deverá acionar diretamente os serviços socioassistenciais e de saúde e as respectivas redes de proteção para que realizem a abordagem adequada, nos termos da legislação vigente.

Art. 10. As equipes de zeladoria urbana deverão respeitar os bens das pessoas em situação de rua.

§ 1º É vedada a subtração, inutilização, destruição ou a apreensão dos seguintes pertences da população em situação de rua:

I - bens pessoais, tais como documentos de qualquer natureza, cartões bancários, sacolas, medicamentos e receitas médicas, livros, malas, mochilas, roupas, sapatos, cadeiras de rodas, muletas, panelas, fogareiros, utensílios de cozinhar e comer, alimentos, colchonetes, travesseiros, tapetes, carpetes, cobertores, mantas, lençóis, toalhas e barracas desmontáveis;

II - instrumentos de trabalho, tais como ferramentas, malabares, instrumentos musicais, carroças e material de reciclagem, desde que dentro da carroça.

§ 2º Poderão ser recolhidos objetos que caracterizem estabelecimento permanente em local público, principalmente quando impedirem a livre circulação de pedestres e veículos, tais como camas, sofás, colchões e barracas montadas ou outros bens duráveis que não se caracterizem como de uso pessoal.

§ 3º O Subcomitê de que trata o artigo 13 deste decreto poderá sugerir normas complementares para detalhar as regras referentes à retirada ou à apreensão de outros bens e pertences.

Art. 11. Na hipótese de apreensão administrativa, será deixado com o possuidor ou proprietário, ou no local do recolhimento, notificação ou contra-lacre com o endereço para restituição do pertence em até 30 (trinta) dias.

Parágrafo único. Não poderá ser cobrado qualquer valor para a restituição dos bens prevista no "caput" deste artigo.

DA FORMAÇÃO

Art. 12. O Comitê Intersetorial da Política Municipal para a População em Situação de Rua - Comitê PopRua previsto pela Lei nº 17.252, de 2019, a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania e as Subprefeituras realizarão ações de sensibilização e formação dos servidores e funcionários terceirizados para a atenção à população em situação de rua nas ações de zeladoria urbana.

Parágrafo único. As Secretarias Municipais de Assistência e Desenvolvimento Social, de Segurança Urbana, da Saúde e das Subprefeituras poderão participar da elaboração das atividades de formação referidas no “caput”.

DO MONITORAMENTO

Art. 13. O Subcomitê permanente para o acompanhamento das ações de zeladoria urbana previsto na Lei nº 17.252, de 2019, tem como objetivo fiscalizar a implementação e o cumprimento dos procedimentos previstos neste decreto.

§ 1º O Subcomitê de que trata o "caput" deste artigo será composto por:

I - 1 (um) representante titular e respectivo suplente da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania, que o coordenará;

II - 1 (um) representante titular e respectivo suplente de cada uma das seguintes Secretarias:

a) Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social;

b) Secretaria Municipal de Segurança Urbana;

c) Secretaria Municipal da Saúde;

d) Secretaria Municipal das Subprefeituras.

III - 5 (cinco) representantes titulares e respectivos suplentes do Comitê Intersetorial da Política Municipal para a População em Situação de Rua - Comitê PopRua, necessariamente indicados dentre os representantes da sociedade civil.

§ 2º Serão convidados a compor o Subcomitê:

I - 1 (um) representante titular e respectivo suplente da Defensoria Pública do Estado de São Paulo;

II - 1 (um) representante titular e respectivo suplente do Ministério Público do Estado de São Paulo.

Art. 14. Cabe ao Subcomitê:

I - monitorar, avaliar e fiscalizar as ações de zeladoria urbana, bem como o efetivo cumprimento deste decreto, elaborando relatórios periódicos;

II - receber e, se for o caso, encaminhar denúncias aos órgãos competentes;

III - propor orientações quanto ao previsto no artigo 10 deste decreto;

IV - elaborar sugestões relativas a bagageiros públicos ou outros equipamentos de guarda e custódia de pertences;

V - auxiliar na definição de diretrizes sobre a capacitação dos agentes que atuam nas ações de zeladoria urbana em métodos de mediação e promoção do diálogo nos casos de eventuais conflitos, podendo se utilizar de parceiros externos para a efetiva atuação ou para a qualificação dos profissionais.

Parágrafo único. O Subcomitê poderá requerer às Subprefeituras informações a respeito das ações de zeladoria urbana realizadas.

DA RESPONSABILIZAÇÃO

Art. 15. O servidor ou o empregado de empresa terceirizada que desrespeitar as determinações deste decreto responderá administrativamente por seus atos, nos termos da legislação vigente.

DAS DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 16. A realização da abordagem social permanece a cargo da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social para a realização da abordagem social, devendo ser a ela encaminhados os informes relativos à presença e à necessidade de atendimento a pessoas em situação de rua, nos termos estabelecidos na legislação municipal.

Art. 17. As Secretarias Municipais, as Subprefeituras e a Guarda Civil Metropolitana poderão expedir normas complementares necessárias ao fiel cumprimento deste decreto.

Art. 18. Este decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogados os Decretos nº 57.069, de 17 de junho de 2016, e nº 57.581, de 20 de janeiro de 2017.

PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, aos 28 de fevereiro de 2020, 467º da fundação de São Paulo.

BRUNO COVAS, PREFEITO

ORLANDO LINDÓRIO DE FARIA, Secretário Municipal da Casa Civil

RUBENS NAMAN RIZEK JUNIOR, Secretário Municipal de Justiça

MAURO RICARDO MACHADO COSTA, Secretário de Governo Municipal

Publicado na Casa Civil, em 28 de fevereiro de 2020.


Este texto não substitui o publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo em 29/02/2020, pg. 01.